domingo, 4 de julho de 2010

História da Morte no Ocidente, de Philippe Ariés - Resumo

Áries explica que vai abordar a questão das atitudes diante da morte sob a ótica da sincronia e da diacronia, pois enquanto algumas atitudes permanecem praticamente inalteradas, outras surgem em determinados momentos e são peculiares a determinado período histórico.
O primeiro assunto, a Morte domada, é claramente sincrônico: é a morte vista com naturalidade; dentro deste imaginário a morte é precedida de um aviso dado por signos naturais ou por uma convicção íntima. O autor enumera exemplos que iniciam no século X, passando por dom Quixote, pelos românticos do século XIX, Tolstoi, até 1941, praticamente contemporâneo da produção do livro.
O aviso permite que o moribundo tome tranquilamente suas providências: recolhe-se ao leito, deitado de costas, a cabeça voltada para o oriente.
O cerimonial da partida envolve diversos passos:
• Lamento da vida: evocação nostálgica de seres e coisas amadas
• Perdão dos companheiros
• Pensar em Deus: admitir culpas e homenagear o divino
• Absolvição sacramental
A morte é uma cerimônia pública e organizada; e o mais importante: a simplicidade com que os ritos da morte eram aceitos e cumpridos, sem caráter dramático ou emoção excessiva.
Assim morriam as pessoas durante séculos ou milênios; nessa antiga atitude a morte é ao mesmo tempo familiar e próxima, por um lado, e atenuada e indiferente, por outro.
Arries destaca outro aspecto dessa antiga familiaridade com a morte:
A coexistência dos vivos com os mortos: na Antiguidade (tal como hoje), os mortos eram temidos e mantidos à distância, e a prática de cultos funerários visava impedir que estes voltassem para perturbar os vivos. Mas o culto dos mártires produziu uma visão diferente: os restos mortais são trazidos à cidade para protegê-la; no local é construída uma igreja, e as pessoas querem ter seus corpos enterrados ao lado dos mártires; o cemitério acaba se tornando uma parte da igreja, área pública, ponto de encontros e reunião, até de comércio.

A morte de si mesmo

A partir daqui o autor introduz os aspectos diacrônicos, as pequenas mudanças sutis que darão um sentido dramático e pessoal à familiaridade do homem com a morte.
A familiaridade tradicional com a morte implica uma concepção coletiva da destinação; o homem era profundamente socializado e ligado à natureza e sua ordem natural, respeitada e aceita.
Aries apresenta aqui uma série de fenômenos que vão introduzindo no sistema tradicional uma individualização; analisando representações artísticas do Juízo Final a partir do século XII, que vão passando das tradicionais representações coletivas de ressurreição para uma ênfase no julgamento pessoal; as crenças populares no risco de perder a salvação por cair em tentação no momento da morte e as alusões ao cadáver em decomposição nas artes e na literatura, ele conclui que:

Durante a segunda metade da Idade Média, do século XII ao século XV, deu-se uma aproximação entre três categorias de representações mentais: as da morte, as do reconhecimento por parte de cada indivíduo de sua própria biografia e as do apego apaixonado às coisas e aos seres possuídos durante a vida. A morte tornou-se um lugar em que o homem melhor tomou consciência de si mesmo.

E reforça essa individualização com um último argumento: as sepulturas coletivas nas igrejas vão sendo gradativamente substituídas por túmulos individuais.

A morte do outro

Ariés estuda aqui representações artísticas e literárias dos séculos XVI ao XVIII que apresentam a morte de forma mórbida, cruel e violenta; o sofrimento é acentuado. Para o autor, a morte agora está sendo representada como uma ruptura; ao contrário da antiga familiaridade, a morte reveste-se de uma dor apaixonada.
Essa expressão de dor dos sobreviventes é devida a uma intolerância nova com a separação, com a perda. Essa nova percepção é um dos traços do Romantismo.
O autor chama a atenção para as profundas mudanças na dinâmica familiar, no século XVIII, com novas relações fundadas em sentimento e afeição: o moribundo, que antes comunicava seus sentimentos e afetos formalmente num testamento, passa a fazê-lo oralmente, no leito de morte; o luto formal dos tempos medievais torna-se uma sincera manifestação de dor.
Desde o século XVII vai se fortalecendo um novo ritual: a visita regular ao túmulo do morto, o culto da lembrança; a sociedade cultua seus heróis, seus túmulos tornam-se monumentos.

A morte interdita

Ariés acredita que a atitude diante da morte conheceu mudanças brutais no século XX; uma delas é a tendência de ocultar do moribundo a real gravidade de seu estado; a verdade começa a tornar-se problemática.
O antigo costume de morrer em casa é substituído pela morte no hospital; a assistência familiar que o moribundo tinha é substituída pela equipe hospitalar. O luto é discreto e as formalidades para enterrar o corpo são cumpridas rapidamente. A modernidade está ameaçando até mesmo a visita ao túmulo: agora recorre-se cada vez mais à cremação, como se houvesse uma ânsia por fazer desaparecer e esquecer tudo o que pode restar do corpo.

Ariés, baseando-se no sociólogo inglês Geoffrey Gorer, vê formar-se um tabu em torno da morte; o excessivo apego à vida, tão característico de nossa civilização industrial, parece ter criado um horror à idéia de morrer. A sociedade tradicional reprimia o sexo e encarava a morte naturalmente; agora vemos o oposto: o sexo é apresentado às crianças cada vez mais cedo, mas se oculta delas tudo que diz respeito à morte.
O autor atribui o fenômeno ao hedonismo moderno, uma obsessão por estar sempre feliz, evitando tudo que possa causar tristeza ou aborrecimento; característica particularmente evidente na sociedade norte-americana.

Comentários

Philippe Ariés, em seu original estudo das atitudes diante da morte, demonstra uma evidente simpatia pelo que ele denomina de morte domada, a tradicional naturalidade com que o fenômeno da morte é encarado; ele caracteriza o fenômeno como sincrônico, está presente em todos os recortes temporais estudados, até os dias de hoje.
Tive a oportunidade de acompanhar um caso que ilustra bem a definição de Ariés; era um senhor colombiano, conhecido nos meios esotéricos como Rabolu. Em dado momento de sua vida, em pleno ano 2000, ele demonstrou uma pressa incomum em concluir o projeto de um livro, e revelou a razão: a “advertência” chegara, ele estava prestes a partir; despediu-se dos estudantes e amigos e morreu de uma parada cardíaca.
Ao estudar os fenômenos que vão transformando a visão tradicional, fica evidente que as mudanças estão atreladas a uma tomada de consciência do ser como indivíduo; o centro de gravidade das mentalidades vai se deslocando do coletivo para o indivíduo. Ainda que Áries não estabeleça um nexo causal com a crise feudal e o surgimento da Idade Moderna, o recorte temporal estabelecido (séculos XII ao XV) é coincidente, e a individualização é uma característica marcante das expressões culturais do Renascimento.
Ao observarmos o relato do imaginário medieval sobre a questão da morte fica evidente a preeminência da religiosidade naquele período, e de como ela permeava todas as outras relações e as “amarrava”.
Ao enfocar os elementos causadores de mudanças, Áries dá ênfase a explicações de fundo psicológico (repressão e sublimação) e estabelece relações com fenômenos sociais (novas relações familiares fundadas em sentimento e afeição, no século XVII), artísticos e religiosos. Dinâmicas sociais como a intensa urbanização são usadas para explicar algumas das rápidas transformações que acometem o imaginário do século XX.
O cômputo final parece ser negativo; apesar do desenvolvimento da consciência individual, o autor vê na moderna percepção da morte um apego hedonista à vida; o homem esquece-se da morte para não sofrer, e por isso mesmo sofre horrivelmente sempre que a morte ocorre.
O autor finaliza com um questionamento: nossas culturas tecnizadas terão ficado impossibilitadas de reencontrar a confiança ingênua no Destino?

4 comentários:

  1. amigo preciso muito deste livro vc não pode me vendê-lo pois não o encontro em livraria auguma.
    resposta para:
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